Por Felipe Guzzo e Pedro Cambraia

A produção orgânica no Brasil não é uma atividade recente, na verdade, você já parou pra pensar que a produção orgânica é muito mais antiga que a dita “convencional”?

Enquanto o modelo “agro é pop” possui aí seus 60 anos, a agricultura no Brasil é praticada de forma orgânica pelos povos originários há muito mais tempo. Porém, focando na produção orgânica como a que se contrapõe ao uso de agrotóxicos, organismos geneticamente modificados ou fertilizantes sintéticos, essa remonta aos anos 1970 (veja nossas outras postagens para mais detalhes).

Foi com muita luta das diversas organizações pela regulamentação da produção orgânica que nós chegamos até o cenário atual, com a lei nº 10.831/03 e o Decreto Nº 6.323/07 que se constituiu um marco regulatório para a produção orgânica. Um grupo de destaque no território nacional é a Rede Ecovida, pioneira no desenvolvimento da certificação participativa, que mais tarde se tornaria o Sistema Participativo de Garantia. A rede, graças a sua organização descentralizada, hoje, é capaz de articular 27 núcleos regionais, em mais de 350 municípios, totalizando 340 grupos de agricultores e mais de 4.500 famílias envolvidas. Dentro do estado do Rio de Janeiro temos a ABIO (Associação de Agricultores Biológicos do Estado do Rio de Janeiro), como importante liderança na luta para a criação de feiras orgânicas e grupos de SPG. A associação foi criada em 1985, mas ganhou força com o aumento da visibilidade do movimento contra a agroindústria, principalmente por eventos como a Rio 92, sempre lutando por mecanismos alternativos à certificação por auditoria, de custo alto para os pequenos produtores. No ano de 2010 foi constituida uma OPAC (Organismo Participativo de Avaliação de Conformidade), que em 2017 já contava com 39 Grupos SPG e 565 associados.

Para um agricultor comercializar seus produtos como orgânicos, ele precisa de um registro no MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. A legislação brasileira permite três diferentes mecanismos para conseguir esse registro:

  • Certificação por Auditoria (certificação privada), nesse método o agricultor contrata uma certificadora especializada e paga anualmente um valor por projeto desenvolvido.
  • Controle Social para Venda Direta, nesse caso o produtor deve estar vinculado a uma Organização de Controle Social (OCS) e seu produto orgânico deve ser vendido apenas diretamente e sem certificação.
  • Sistema Participativo de Garantia (SPG), nesse sistema um Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade Orgânica (OPAC) credenciado e fiscalizado pelo MAPA é quem emite os certificados e responde legalmente pelo SPG. Esse Sistema é composto por Fornecedores (produtores, distribuidores, etc.) e Colaboradores (consumidores, ONGs, técnicos, etc.) que dividem de forma participativa as responsabilidades quanto à avaliação de conformidade dos produtos e método organizacional.

Enquanto as Certificações por Auditoria permitiram que produtores com maior poder aquisitivo pudessem acessar o mercado de produtos orgânicos inclusive exportando-os (uma vez que essa certificação é mais aceita em outros países que trabalham com orgânicos), os SPG permitiram que o campesinato que não conseguia arcar com os custos da Auditoria também conseguisse a certificação o que tem feito a produção orgânica do Brasil aumentar exponencialmente.

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O SPG é uma realidade que vem se expandindo pelo mundo inclusive tendo o Brasil assinado em setembro de 2018 um acordo de mutualidade com o Chile para facilitar o processo de exportação, incluindo os sem certificação privada, uma vez que o Chile também reconhece o sistema participativo. Os resultados apontados pelo relatório do IPEA (2020) mostram que apesar dos desafios estruturais e históricos, além da tendência mundial de concentração territorial e socioeconômica dos mercados de produtos orgânicos, o SPG brasileiro e os mercados institucionais para compra destes produtos, têm possibilitado que a sua produção não se desvirtue dos princípios agroecológicos ajudando a fortalecer a segurança e soberania alimentar e servindo de exemplo para outros países.

Referências:

  • https://agrosaber.com.br/producao-organica-auditada-ja-responde-por-442-das-propriedades-certificadas-no-brasil/
  • https://abiorj.org/o-spg-explicado/
  • https://ojoioeotrigo.com.br/2019/10/brasil-e-pioneiro-na-certificacao-participativa-de-organicos/
  • https://portal.ifsuldeminas.edu.br/images/PDFs/proex/publicacoes_livros/SPG_Brasil_-_E-Book_-_HirataRocha_-_IFSULDEMINAS_1.pdf
  • http://aspta.org.br/2014/11/13/producao-agroecologica-comercializacao-e-certificacao-participativa-no-municipio-de-guapimirim-a-experiencia-da-afojo/
  • http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/9678/1/TD_2538.pdf
  • https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/sustentabilidade/organicos/arquivos-publicacoes-organicos/sistema_participativo.pdfhttp://ecovida.org.br/